quarta-feira, 14 de outubro de 2009

A VERDADEIRA REVOLUÇÃO FARROUPILHA

A organização militar da República Rio-Grandense
Os farroupilhas possuíram um efetivo de 9.372 homens, assim repartidos:

4.296 homens de 1ª Linha

5.076 homens da Guarda Nacional

Este efetivo distribuía-se por diversos corpos conforme quadro que publicamos em O Negro e descendentes...citado sob o título: Efetivo Total do Exército da República Rio-Grandense

Organização dos corpos de lanceiros negros

Os dois corpos de lanceiros eram constituídos, basicamente, de negros livres ou de libertos pela República Rio-Grandense, enquadrados por valorosos oficiais brancos.

Possuíam 8 companhias a 51 homens cada, totalizando 426 lanceiros .

Tornou-se célebre o 1º Corpo de Lanceiros Negros organizado e instruído, inicialmente, pelo Coronel Joaquim Pedro Soares, antigo capitão do Exército Imperial, que se destacara nas guerras platinas e cujo perfil histórico abordamos em O Exército farrapo e seus chefes .v.1,p168/170.Era veterano da guerra de expulsão dos franceses de Portugal depois que mandado invadir por Napoleão.

Secundou o Coronel Joaquim Pedro, nesta tarefa, o Major Joaquim Teixeira Nunes, veterano e com ação destacada na Guerra Cisplatina.

Este bravo, à frente deste Corpo de Lanceiros Negros, libertos, prestaria relevantes serviços militares à República Rio-Grandense.

O 1º Corpo foi recrutado, principalmente, entre os negros das charqueadas de Pelotas e do então município de Piratini ( atuais Canguçu, Piratini, Pedro Osório, Pinheiro Machado, Herval do Sul, Bagé, até o Pirai e parte de Arroio Grande).

Foram seus oficiais, entre outros:

Coronel Joaquim Pedro Soares

Coronel Joaquim Texeira Nunes

Tenente Manoel Alves da Silva Caldeira

Capitão Vicente Ferrer de Almeida

Cap. Marcos d’ Azambuja Cidade

1º Ten. Antônio José Coritiba

2º Ten. Caetano Gonçalves da Silva(filho de Bento Gonçalves)

2º Ten. Ezequiel Antônio da Silva

2º Ten. Antônio José Pereira

Teixeira Nunes ,Caldeira e Vicente Ferrer foram ligados a Canguçu.

Teixeira Nunes nasceu próximo à atual cidade de Canguçu. Caldeira era da região de Vila Freire mas viveu muitos anos na Florida em Canguçu e foi o biógrafo de Teixeira Nunes, conforme revelação de Otelo Rosa, em Vultos Farroupilhas, ao basear-se em carta deste bravo, publicada pela Revista do IHGRGS – 1927.

Vicente Ferrer de Almeida, natural de Lavras foi o primeiro funcionário público de Canguçu, por ocasião da instalação deste município, em 1857.

Caldeira foi fundador do primeiro Clube Republicano de Canguçu, na Florida e Iguatemi em 1884 e representou Canguçu em histórico encontro de republicanos em Porto Alegre .

Tenho para min que foi inspirado em sua vida que J.Simões Lopes Neto criou o Blau Nunes seu interlocutor imaginário em Contos gauchescos .

O Corpo de Lanceiros Negros em campo do Menezes

O 1º Corpo de Lanceiros Negros, ao comando do Tenente - Coronel Joaquim Pedro Soares e subcomandado pelo então Major Teixeira Nunes, teve atuação importante no combate de Seival, de 11 de setembro de 1836 ,em reforço à Brigada Liberal de Antônio Netto que surgiu por transformação do Corpo da Guarda Nacional de Piratini integrado por 2 esquadrões com 4 companhias, recrutados em Piratini e em seus distritos Canguçu, Cerrito e Bagé até o Pirai .

" Joaquim Pedro Soares... foi o organizador e instrutor do famoso 1º Corpo de Lanceiros Negros .As tropas para o combate de Seival foram dispostas por Joaquim Pedro, na qualidade de imediato e assessor militar de Antônio Netto.

Deixou um esquadrão em reserva que foi empregado em momento oportuno, decidindo a sorte da luta".

Segundo Souza Docca, coube a este bravo e a Manoel Lucas de Oliveira convencerem Antônio Neto da proclamação da República Rio-Grandense, bem como " a grande satisfação de ler, a 11 , no campo do Menezes, à frente da garbosa tropa por ele instruída, a Proclamação da República Rio-Grandense." Idéia de República que teria sido sugerida pelos cariocas majores João Manoel de Lima e Silva(tio de Caxias ) e José Mariano de Mattos e que antes da Revolução comandavam as unidades de Infantaria e de Artilharia do Exército destacadas no Rio Grande do Sul e mais pelo filho de Diamantina José Domingos de Almeida .

Um depoimento de testemunha dos acontecimentos:

" Em 6 de novembro de 1836, menos de dois meses após Seival, Teixeira Nunes era Major do Corpo de Lanceiros Negros, a esse tempo comandado pelo Ten. Cel Joaquim Pedro Soares.

Assim fica evidente a grande contribuição do gaúcho negro e mulato para a vitória de Seival e para a proclamação da República Rio-Grandense, onde buscam inspiração as mais caras tradições políticas e militares do povo gaúcho. República que enformou no gaúcho histórico do Rio Grande do Sul duas características sociológicas excelsas: Firmeza e Doçura.

Recrutamento dos Lanceiros Negros

O Corpo de Lanceiros Negros era integrado por negros livres ou libertados pela Revolução e, após, pela República, com a condição de lutarem como soldados pela causa..

Recorde-se que Artigas havia usado o mesmo expediente. Os Lanceiros negros, em sua grande maioria, foram recrutados entre os negros campeiros e domadores da atual Zona Sul do Estado bem como negros tropeiros das charqueadas e nestas funções amavam a liberdade, acostumados que estavam a movimentar-se dentro da amplidão dos horizontes da terra gaúcha nas lides pecuárias.

Armamento Individual

Excelentes combatentes de Cavalaria, entregavam-se ao combate com grande denodo, por saberem, como verdadeiros filhos da liberdade, que esta, para si, seus irmãos de cor e libertadores, estaria em jogo em cada combate.

Manejam como grande habilidade suas armas prediletas – as lanças.

Estas, por eles usadas mais longas do que o comum. Combinada esta característica, com instrução para o combate e disposição para a luta, foram usados como tropas de choque, uso hoje reservado às formações de blindados.

Por tudo isto infundiram grande terror aos adversários.

Rusticidade e obediência

Eram rústicos e disciplinados. Faziam a guerra à base de recursos locais, Comiam se houvesse alimento e dormiam em qualquer local, tendo como teto o firmamento do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina .A maioria montava a cavalo quase que em pêlo, a moda charrua.

Vestuário ou Uniforme

Seu vestuário era constituído de sandálias de couro cru, chiripá de pano grosseiro, um colete recobrindo o tronco e na cabeça uma vincha vermelha símbolo de República .

Os Corpos de Lanceiros Negros conquistaram a Liberdade, lutando pela República Rio-Grandense nos campos de batalha. O Império respeitou suas liberdades pela cláusula IV da Paz de Ponche Verde. " São livres e como tais reconhecidos todos os cativos que serviram à República" .

Cláusula respeitada por conta e risco pelo Barão de Caxias contrariando determinação superior de os recolher como escravos estatais para a Fazenda de Santa Cruz no Rio de Janeiro .

Caxias usou o seguinte expediente para não os enviar para o Rio Considerou que eles haviam se apresentado livremente .E a seguir os libertou e os incorporou as 3 unidades de Cavalaria Ligeira do Exército Imperial no Rio Grande .E em Ponche Verde em D. Pedrito foram acolhidos pelos coronéis Manoel Marques de Souza e Osório comandantes de duas unidades de Cavalaria.

Como esporas improvisavam uma forquilha de madeira presa ao pé com tiras de couro cru. Esta espora farroupilha acomodava-se ao calcanhar e possuía a ponta bem afiada.

Alguns poucos usavam calças, cartola e chilenas (esporas), como o imortalizado em pintura no Museu de Bolonha, Itália, reproduzido no Atlas Histórico e Geográfico do MEC – 1996 .

Eram armados também com adaga ou facão e, em certos casos, algumas armas de fogo em determinadas ocasiões.

Como lanceiros não fizeram uso de escudos de proteção, tão comuns na História Militar dos povos.

Os seus grosseiros ponchos de lã – bicharás, serviram-lhes de cama, cobertor e proteção do frio e da chuva.

Quando em combate a cavalo, enrolado no braço esquerdo, o poncho(bichará) servia-lhes para amortecer ou desviar um golpe de lança ou espada.

No corpo a corpo desmontado, servia para aparar ou desviar um golpe de adaga ou espada em cuja esgrima eram habilíssimos, em decorrência da prática continuada do jogo do talho, nome dado pelo gaúcho à esgrima simulada com faca, adaga ou facão.

Alguns poucos eram hábeis no uso das boleadeiras como arma de guerra, principalmente para abater o inimigo longe do alcance de sua lança, quer em fuga, quer manobrando para obter melhor posição tática.

Parte do 1º Corpo de Lanceiros Negros participou da expedição a Laguna, ao comando de Davi Canabarro, que teve como comandante de Vanguarda o Tenente - Coronel Joaquim Teixeira Nunes com seus Lanceiros Negros

É bastante conhecido, na História da Revolução Farroupilha, o fato de que estes dois célebres, valorosos e intrépidos chefes e combatentes possuíam em suas forças Lanceiros negros.

A retirada dos farroupilhas de Laguna para o Rio Grande do Sul, através de Lajes e Vacaria, contou com a presença de Teixeira Nunes, Garibaldi, Rosseti e Anita e foi assegurada por muitos valorosos Lanceiros negros.

Foi por certo lembrando Teixeira Nunes e seus bravos lanceiros negros, que o acompanharam na expedição a Laguna, que Garibaldi escreveu:

"Eu vi batalhas disputadas mas nunca e em nenhuma parte homens mais valentes nem lanceiros mais brilhantes do que os da cavalaria rio - grandense, em cujas fileiras comecei a desprezar o perigo e a combater pela causa sagrada dos povos."

Deve-se talvez a Garibaldi, no Museu de Bolonha, Itália, o quadro intitulado Farroupilha, que fixa e imortaliza um lanceiro negro da República Rio-Grandense.

Pintura de um lanceiro negro farrapo existente em museu de Bologna Itália da tropa de Teixeira Nunes que participou da expedição a Laguna e que de lá retornou por terra junto com Garibaldi e Anita .

Quando irrompeu a Revolução Farroupilha, no mesmo dia, em São Leopoldo, o Dr. Hillebrand lançou a seguinte proclamação:

"Convidado insistentemente pelo Presidente da Província, e autorizado pelo Juiz de Paz deste Distrito, passo a comunicar aos meus patrícios alemães que um partido pela maior parte composto de negros e índios, está ameaçando as autoridades desta Província."

Esta proclamação difundida na Alemanha, segundo Walter Spalding, deu a impressão de que a " Revolução Farroupilha era uma violenta rebelião de negros índios ou racial."

4 comentários:

  1. PORONGOS: COVARDIA, TRAIÇÃO, FALSIDADE

    "Depois de lutarem, durante dez anos, não por dinheiro ou impostos, mas pela liberdade, no dia 14 de novembro de 1844 foram miseravelmente traídos no mais vergonhoso episódio dessa guerra, conhecido como “O Massacre de Porongos”. Desarmados, por seu comandante Canabarro, esses homens foram traiçoeiramente entregues a sanha historicamente genocida de Caxias."

    A Revolução Farroupilha foi a mais longa revolta republicana contra o Império escravocrata e centralizador brasileiro. Os grandes e poderosos proprietários de terras gaúchos, sentindo-se desfavorecidos pelas leis federais, principalmente pelos impostos considerados excessivos, entram em negociações com o governo regencial. Tais negociações, consideradas insatisfatórias, criam um crescente estado de tensão até o rompimento definitivo e a declaração de guerra, em 20 de setembro de 1835.

    Depois do combate travado em Bagé, conhecido como “a Batalha do Seival”, em que as forças imperiais foram surpreendente e rotundamente derrotadas, surge um movimento político dissidente e separatista. Com sua radicalização é proclamada a independência e criada a República Rio-Grandense frente ao Império do Brasil, propondo uma República Federativa às demais províncias que viessem a separar-se do Império e assumissem a forma republicana.

    Para lutar por “um país independente” foi necessário juntar as tropas dos generais que aderiram à causa e assim foi formado o “exército farroupilha” liderado pelo Gen. Bento Gonçalves. Na verdade, os verdadeiros protagonistas dessa luta foram os negros, os índios, os mestiços e os brancos pobres que lutaram de forma abnegada pela recém criada República e por espaços de liberdade, buscando um futuro melhor para si e para os seus. Entre os generais está um abolicionista convicto, Antônio de Souza Netto, que não só coloca a libertação dos escravos como um dos “ideais farroupilha” como propõe a participação dos negros na luta dos farrapos. Num primeiro momento a idéia é rejeitada. Porém, em 4 de outubro de 1836”, depois da “Derrota de Fanfa”, em que Bento Gonçalves foi preso e o exército farroupilha teve excessivas baixas, eles não vacilaram em libertar os escravos que, em troca, se engajaram no exército farroupilha. Assim foi criada a unidade militar que ficou conhecida como os Lanceiros Negros.

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  2. Nesse corpo de Lanceiros Negros só havia branco os oficiais superiores. Os negros eram os melhores domadores de cavalos da província. Suas lanças eram maiores do que as ordinárias, os rostos pretos como azeviche. Seus corpos robustos e a sua perfeita disciplina os tornavam o terror dos imperiais. A participação decisiva dos Lanceiros Negros foi ressaltada pelo republicano Giuseppe Garibaldi – “herói dos dois mundos” - em sua biografia escrita por Alexandre Dumas: “soldados de uma disciplina espartana, que com seus rostos de azeviche e coragem inquebrantável, punham verdadeiro terror ao inimigo” ou ainda “...mas nunca vi, em nenhuma parte, homens mais valentes, ...em cujas fileiras aprendi a desprezar o perigo e combater dignamente pela causa sagrada das nações...” (GARIBALDI,Giuseppe, em FAGUNDES, M. Calvet, História da Revolução Farroupilha. EDUCS.1989.p. 9).

    Depois de lutarem, durante dez anos, não por dinheiro ou impostos, mas pela liberdade, no dia 14 de novembro de 1844 foram miseravelmente traídos no mais vergonhoso episódio dessa guerra, conhecido como “O Massacre de Porongos”. Desarmados, por seu comandante Canabarro, esses homens foram traiçoeiramente entregues a sanha historicamente genocida de Caxias.

    A “Traição de Porongos” e o Massacre dos Lanceiros Negros

    Como explicar aos brasileiros tamanha covardia e a baixeza moral perpetradas por dois homens, David Canabarro e Duque de Caxias, ambos idolatrados como “heróis” pela historiografia oficial - um deles até considerado “patrono do Exército” - durante a chamada Revolução Farroupilha? Os historiadores oficiais criaram deliberadamente imagens falsas de Porongos procurando não macular “seus” heróis. Entretanto, a hediondez dos acontecimentos só nos permite uma coisa: não a explicação, mas a revelação da verdade, baseada em documentos oficiais que ficaram escondidos por décadas e só agora revelados.

    As crescentes dificuldades enfrentadas pela nova República e as disputas políticas na região do Prata, preocupantes para as autoridades do Império, impuseram às duas partes negociações de paz. Uma vitória militar decisiva dos farrapos sobre o exército imperial, comandado pelo então Barão de Caxias, tornara-se cada vez mais inviável. Por parte do Império era importante terminar logo a luta e buscar uma paz negociada, pois tudo indicava a inevitabilidade da luta com os vizinhos platinos. Mas para as duas partes era importante resolver a questão dos negros em armas. Os revoltosos haviam prometido liberdade aos negros que lutavam no exército farroupilha e com isso a Corte Imperial não concordava. Era um perigo para os escravocratas brasileiros um grande número de negros armados. E se eles, agora bastante coesos, procurassem asilo no Uruguai e a partir daí continuassem a guerra com táticas de guerrilhas, fazendo do território uruguaio seu santuário? Isso levaria à guerra e “poderia provocar graves problemas com a Argentina de Juan Rosas” (LEITMAN Spencer, Negros Farrapos: hipocrisia racial no sul do Brasil no séc.XIX e DACANAL José, A Revolução Farroupilha: história e interpretação. Porto Alegre: Mercado Aberto.1985. p. 72)
    Pelo lado dos farrapos, Bento Gonçalves foi afastado da liderança, e os novos líderes, David Canabarro e Antônio Vicente da Fontoura, ambos escravocratas, negociavam a paz com Caxias. A promessa de liberdade para os combatentes negros depois de 10 anos de abnegadas e vitoriosas lutas deles nas batalhas pesava muito nas negociações.

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  3. Foi neste contexto que aconteceu, na madrugada de 14 de novembro de 1844, o “Massacre de Porongos” em que os Lanceiros Negros – previamente desarmados por Canabarro e separados do resto das tropas – foram atacados de “surpresa” e dizimados pelas tropas imperiais comandadas pelo Cel. Francisco Pedro de Abreu (o Moringue), através de um conluio entre o barão (mais tarde duque) de Caxias e o gen. Canabarro para se livrarem dos negros em armas e poderem finalmente assinar a Paz de Ponche Verde. “Traição de Porongos, que mais foi a matança de um só lado do que peleja, dispersou a principal força republicana e manifestou morta a rebelião. (...) Em Porongos pois, a revolução expirou. Foi daí que seguiu-se o entabulamento das negociações, que deram tranqüilidade ao Rio Grande do Sul” (ARARIPE, Tristão de Alencar. Guerra civil no Rio Grande Do Sul: memória acompanhada de documentos lida no Instituto Histórico Geográfico do Brasil. Porto Alegre, CORAG, 1986, p.211).

    “Caxias confiava no poder do ouro. Com poderes ilimitados e verbas consideráveis para sobrepor-se aos “obstáculos pecuniários” que surgissem ao negociar com os líderes farrapos, ele tentou um acordo com David Canabarro, o principal general farrapo, para terminar a guerra. De comum acordo decidiram destruir parte do exército de Canabarro, exatamente seus contingentes negros, numa batalha pré-arranjada, conhecida como “Surpresa de Porongos” em 14 de Novembro de 1844” (LEITMAN, Spencer. Negros Farrapos ...Idem p. 75)

    Em suas instruções secretas a Moringue, o comandante da operação, Caxias, orientou-o no sentido de poupar brancos e índios, que poderiam ser úteis para futuras lutas.

    Cópia integral dessas “instruções secretas” encontra-se no Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul e nela está afirmado: Reservado: “Senhor Cel. Francisco Pedro de Abreu (...) Regule V.S. suas marchas de maneira que no dia 14, às duas horas da madrugada possa atacar as forças ao mando de Canabarro que estará neste dia no cerro dos Porongos (...) Suas marchas devem ser o mais ocultas que possível seja, inclinando-se sempre sobre a sua direita, pois posso afiançar-lhe que Canabarro e Lucas ajustaram ter as suas observações sobre o lado oposto. No conflito, poupe o sangue brasileiro o quanto puder, particularmente da gente branca da Província ou índios, pois bem sabe que essa pobre gente ainda nos pode ser útil no futuro. A relação justa é das pessoas a quem deve dar escapula, se por casualidade caírem prisioneiros. Não receie a infantaria inimiga, pois ela há de receber ordem de um ministro de seu general em chefe para entregar o cartuchame sob o pretexto de desconfiarem dele. Se Canabarro ou Lucas forem prisioneiros, deve dar-lhes escapula de maneira que ninguém possa nem levemente desconfiar, nem mesmo os outros que eles pedem que não sejam presos (...) 9 de novembro de 1844.Barão de Caxias” [AHRS. Anais do Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul-Volume 7. Porto Alegre, 1963. P.30/31].

    Canabarro cumpriu sua parte no combinado, deu ordem ao quartel-mestre para recolher o cartuchame de infantaria e carregá-lo em cargueiros para serem distribuídos quando aparecesse o inimigo e separou os negros farrapos do resto da tropa. Isolados e desconhecendo a traição de seu comandante, os Lanceiros Negros resistiram bravamente antes de serem liquidados. O “Combate de Porongos” – no qual oitenta, de cada cem mortos, eram negros – abriu caminho para a Paz de Ponche Verde alguns meses depois.

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  4. A indignação de Bento Gonçalves com Canabarro é revelada logo após o “combate” de Porongos quando diz que os “caminhos indispensáveis por onde Canabarro tinha de avançar eram tão visíveis que só poderiam ser ignorados por quem não quisesse ver nem ouvir ou por quem quisesse ouvir a traidores, talvez comprados pelo inimigo! (...) Perder batalhas é dos capitães e ninguém pode estar livre disto; mas dirigir uma massa e prepará-la para sofrer uma surpresa semelhante (...) é (...) covardia do homem que assim se conduz”. [Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul. Coletânea de Documentos de Bento Gonçalves da Silva. 1835/1845]

    Poucos dias depois, Teixeira Nunes e os Lanceiros Negros remanescentes são enviados por Canabarro para uma ação altamente temerária na retaguarda inimiga (sobre a qual pairam também suspeitas). Atacados por Chico Preto, são aniquilados e seu comandante é ferido e depois assassinado.

    Tal como nos dias de hoje em que as autoridades do país escondem seus crimes hediondos, alguns contra a humanidade, amparadas por leis fraudulentamente arrancadas de um congresso corrupto até a alma, como é o caso dos crimes praticados pelas autoridades civil e militar durante o período 64/85, a “Traição de Porongos” permaneceu como um segredo guardado a sete chaves por muitos anos.

    CEBRASPO – Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos

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